quinta-feira, 24 de outubro de 2013
REMINISCÊNCIAS DA RUA PRINCESA ISABEL – A SAGA DE FLORIANO - EL BODEGUERO – II
Fonte: ormuzsimonetti.blogspot.com
...Naquela época, bodegas, vendas e mercearias, eram pontos de encontro de amigos. A bodega de Floriano, como era conhecida, tinha sua localização bastante privilegiada. Próxima do Grande Ponto, na época centro nevrálgico da cidade de Natal, frequentado principalmente por intelectuais, políticos e homens de negócios. O nome Grande Ponto vem desde a época dos bondes. Ali existia um café com esse nome no cruzamento da Av. Rio Branco com a Rua Pedro Soares, que a partir de 1930 passo a se chamar Rua João Pessoa. Anos depois desaparecia o café, porém o cruzamento eternizou-se com o nome Grande Ponto.
Era passagem obrigatória para quem subia a ladeira do Baldo procedente do Alecrim com destino ao bairro da Ribeira e o centro da cidade, como também os passantes advindos dos arrabaldes de Tirol e Petrópolis, que se destinavam ao populoso bairro do Alecrim.
Bodega de Floriano - Foto 2013
Apesar da sua excelente localização geográfica, havia ainda a figura emblemática de Floriano, que com ares de magistrado, administrava seu comércio por atrás daquele velho balcão, ao tempo que recebia sem distinção, num contínuo ritual de entra e sai, notórios e anônimos, que para ali se dirigiam em busca das mais recentes notícias da cidade e também para beber na fonte do conhecimento e do entretenimento gratuito, de uma boa e divertida conversa, uma vez que o velho Floriano, além de inteligente era especialista em “causos”, herança passada para seu sobrinho Valério Mesquita, que divertiam seus ouvintes, para não se falar na maior de suas qualidades: a de leitor compulsivo.
Nas lembranças dos veteranos Jurandyr Navarro e Ticiano Duarte, desde a década de 40, costumavam passar por ali para “dois dedos de prosa”: Sebastião Fagundes. Seu pai era proprietário de um açougue em frente a bodega de Floriano; Luiz Rabelo, oficial da policia militar, boêmio, inteligência privilegiada e uma das maiores expresses da poesia potiguar; os irmão Ageu, Orlando e José Garcia, este último muito querido pelos amigos e de temperamento afável. Foi covardemente assassinado por desafetos de seu irmão mais velho Ageu Garcia, que o tocaiaram na Avenida Rio Branco próximo a casa do padre Monte, em plena luz do dia. Os irmãos Juarez e Vladimir Limeira, fanático torcedor do Vasco. Escrevia matérias sobre futebol no jornal religioso “A Ordem”. Os irmãos José Estanislau e Tarcisio Fonseca, Sebastião e Sílvio Fagundes, Crizanto, Sandoval e Breno Capistrano que moravam na Av Rio Branco. Breno era piloto de avião e após o casamento mudou-se para Cuba onde permaneceu por vários anos. Joldemar, apelidado de “Touro” e também de “Canela de Ferro”. Era um tipo excêntrico, gostos esquisitos e de estomago de aço. Conta-se que gostava de se exibir chupando mangas caídas nos quintais, preferencialmente as mais maduras que ao cair no chão ficavam cheias de bichinhos (pupas). De outra feita, na bodega de Floriano arrebatou de uma só vez e com rapidez impressionante, um punhado de moscas que estavam pousadas sobre migalhas de açúcar em cima do balcão. Após o bote certeiro, mais certeiro ainda foi o local que ele colocou os insetos: dentro da boca e em seguida os engoliu como se fosse algum regalo de nossa culinária; José do Patrocínio, grande professor de português. Vestia-se com sobriedade e agia com austeridade. Quando corrigia alguém por “assassinar a língua pátria”, chamava-o de “analfa”. Morreu provavelmente de cirrose hepática devido ao consumo excessivo de álcool. Durante o governo de Monsenhor Walfredo Gurgel, Jurandyr Navarro então secretário do gabinete civil, conseguiu para o professor um tratamento em Recife, totalmente custeado pelo Estado. Recusou viajar a capital pernambucana vindo a falece meses depois; Clovis Cabana Campos Cortez; Luiz “Senhora”; Rui “Parrudo”; Jeremias, atualmente aposentado do TCE e Josué que foi gerente do Banco do Nordeste em Natal. Mora atualmente no Recife no bairro de Boa Viagem. Editou por muito tempo um pitoresco jornalzinho com o nome de “Gibi Aquático” que era vendido na praia de Boa Viagem. Como diferencial a excentricidade de ser lido, preferencialmente dentro d’água, visto ter suas páginas protegida por um plástico lacrado nas bordas; o próprio Ticiano Duarte, primo de Floriano e os sobrinhos Valério Mesquita e Ivan Maciel; os irmãos Jurandyr e Jahyr Navarro; Roberto Furtado, um dos fundadores do antigo MDB em nosso Estado; José Estanilsau da Fonseca e Tarcísio Fonseca que formou-se engenheiro; Sílvio Fagundes irmão de Sebastião; os irmãos Crizaldo, Crisanto e Crizeldo; Sandoval Capistrano, conhecido boêmio e empresário; os irmãos Geraldo Melo, Assis Melo e outros.
Gibi Aquático
Naquela época a brincadeira mais preferida entre os jovens eram as peladas realizadas no leito da própria rua, naquele tempo de chão batido. Daí ter surgido o saudoso Goitacás, time formado pela meninada da rua que disputava campeonatos com times da redondeza.
O futebol se constituía numa das paixões de Floriano, principalmente, quando o Vasco da Gama, de Ademir Menezes (o queixada) estava em campo. Lembro-me de tê-lo visto, algumas vezes, sentado ao lado do balcão com ouvido colado no velho rádio Zenith, vibrando pelas vozes memoráveis dos narradores Jorge Cury ou Waldir Amaral, as acirradas disputas do time de seu coração. Quando o Vasco ganhava ficava todo faceiro e brincalhão, zombava dos adversários. Entretanto, se perdia, o humor modificava. Falava pouco e por vezes chegava a fechar a bodega mais cedo.
Foto internet
Naquele ambiente pululava entre outras presenças, que por certo serão alvo de futuras narrativas, um verdadeiro séquito de clientes diuturnos, a quem os meninos da época classificavam como “os bebos de Floriano”. Logo pela manhã, iam chegando um a um, como fieis seguidores de uma religião ou mesmo abelhas inebriadas pelo aroma do néctar presente naquela taverna. Pediam uma “caninha” e iam se acomodando nos caixotes de bebidas que serviam de bancos, até que o elenco estivesse completo.
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